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A escolha (nada óbvia) do regime tributário para startups

Até mesmo o regime do Simples Nacional pode se tornar mais complexo

A constituição de uma startup no Brasil navega em um ambiente de dualidades. De um lado, o legislador cria mecanismos, como o Marco Legal das Startups (Lei Complementar 182/2021) e o Inova Simples (Lei Complementar 167/2019), buscando fomentar a inovação.

De outro, há complexidade no sistema tributário. Assim, a escolha do regime de tributação que poderia ser uma mera formalidade contábil, trata-se, em verdade, de uma decisão estratégica.

Inova Simples no fomento à inovação

O regime tributário do Inova Simples foi projetado para permitir a formalização ágil de modelos de negócio inovadores. Sua premissa é clara: um CNPJ rápido, de baixo custo, para uma operação em fase “experimental".

Os números oficiais, no entanto, podem gerar um debate sobre a efetividade. Dados disponibilizados pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC) indicam que, até o final de 2023, o país contava com 2.563 empresas ativas no Inova Simples. Embora demonstre alguma tração e ainda não tenham sido disponibilizadas as estimativas relativas à 2024, o número já se mostrava tímido frente ao universo de startups em atividade e em comparação aos anos anteriores.

Mas, afinal, a baixa adesão das startups ao Inova Simples seria fruto de desconhecimento ou da limitação imposta pelo teto de faturamento de R$81mil anuais, que torna o regime um estágio excessivamente curto para negócios com qualquer grau de escala? Acredito que a justificativa seja uma conjugação de ambas as situações.

O paradoxo do Simples Nacional para startups

Ao esgotar o teto do Inova Simples (R$ 81 mil), a transição para o Simples Nacional é frequentemente vista como o passo natural da startup. Contudo, para uma startup — especialmente as com planos de captação de investimento — essa escolha pode ser uma armadilha.

Uma das principais controvérsias nasce da complexa regra sobre os créditos de PIS e Cofins. A Lei Complementar 123/2006, em seu artigo 23, veda de forma geral que empresas do Simples Nacional transfiram créditos. Contudo, uma interpretação posterior da Receita Federal (Ato Declaratório Interpretativo 15/2007) permite que um cliente no regime de Lucro Real se credite, mas com uma condição crucial: a aquisição deve ser classificada como insumo para sua própria atividade.

Além disso, o regime tributa o faturamento bruto e não o lucro. Portanto, mesmo que não haja restrição advinda do objeto social, condição dos sócios, porte da empresa e natureza jurídica, em um modelo de negócio que reinveste em crescimento e/ou opera com prejuízo nos primeiros anos, a startup acaba sendo penalizada em detrimento da facilidade contábil.

Nesse cenário, por exemplo, o Lucro Real serviria como uma ferramenta estratégica. Ao tributar o resultado líquido, ele se alinha perfeitamente à jornada de uma startup que reinveste todo o seu caixa em prol do crescimento.

Complexidade contábil como vantagem tributária estratégica

Para ilustrar que a escolha do regime tributário para startups não é algo óbvio e imediato, vale analisar (ainda que em termos gerais) a Pipefy – unicórnio curitibano constituído em 2014 e que, por sua natureza, exemplifica a lógica de startups que nunca optaram pelo Simples Nacional.

A Pipefy oferece uma plataforma global de software como serviço (SaaS) que permite a automação de processos sem a necessidade de programação. Seus clientes são, majoritariamente, empresas de médio e grande porte.

Ainda que sua atividade de software fosse legalmente permitida no Simples Nacional, a escolha seria estrategicamente desastrosa, já que para a startup competir globalmente e atrair grandes clientes empresariais exige-se, desde o início, uma análise tributária atrelada ao modelo de crescimento, baseado em altos investimentos em tecnologia e expansão.

Em casos como esses, é comum verificar prejuízo nos primeiros anos de atuação. À vista disso, o Lucro Real poderia ser o regime potencialmente mais vantajoso. Contudo, passando a obter ganhos, importa realizar análise detalhada, comparando os custos e investimentos com a própria margem de lucratividade da startup (e futuro unicórnio, tal como no caso da Pipefy).

Portanto, a recomendação pelo Simples Nacional, por sua aparente facilidade operacional, pode ser vantajosa para a rotina da contábil, mas, na maior parte das vezes, é prejudicial ao crescimento estratégico da startup.

Novo contexto com a reforma tributária

A reforma tributária, advinda da Emenda Constitucional 132/2023, aprofunda a complexidade para as empresas do Simples Nacional. A promessa de resolver o problema do crédito de PIS/Cofins com o novo IVA Dual (IBS e CBS) não é uma solução automática, mas sim um novo dilema estratégico às empresas.

A Lei Complementar 214/2025, que regulamenta o novo sistema, instituiu uma bifurcação de caminhos para as empresas optantes pelo Simples Nacional, criando duas possibilidades:

1) Apuração unificada pelo Simples Nacional

A empresa pode optar por continuar recolhendo seus tributos de forma unificada no Documento de Arrecadação do Simples Nacional (DAS).

Neste caso, para não quebrar a cadeia não-cumulativa do novo imposto, o art. 47 da LC 214/2025 estabelece no §9º, inciso II que o adquirente da mercadoria ou serviço (o cliente da startup) terá direito “a apropriação de créditos do IBS e da CBS, correspondentes aos valores desses tributos devidos por meio do Simples Nacional” (sic).

Sendo assim, a empresa optante pela tributação unificada, não aproveita créditos de CBS e IBS em suas aquisições, somente o posterior adquirente dos seus produtos ou serviços, mas de modo limitado ao montante apurado via Simples Nacional.

2) Opção de apuração da CBS e do IBS pelo regime geral

Alternativamente, o art. 21, § 1º da LC 214/2025, permite que a empresa do Simples Nacional opte por apurar o IBS e a CBS pelo regime geral de débitos e créditos, enquanto mantém os demais impostos (IRPJ, CSLL e CPP) na sistemática unificada.

A vantagem é clara: a startup passa a aproveitar (na aquisição de insumos) e a gerar o crédito integral do imposto ao adquirente. Tal possibilidade elimina a limitação de crédito descrita no item anterior. O contraponto é a perda da simplicidade, pois o negócio terá que gerenciar a complexa apuração do IVA-dual e suas novas obrigações acessórias.

Além dessas opções, a LC 214/2025 ainda introduz impactos operacionais relevantes, como a necessidade de adequação ao sistema de pagamento dividido do imposto (split payment) e a ampliação do conceito de receita bruta, que pode afetar o enquadramento no regime.

Diante dos apontamentos acima, uma conclusão é fato.

Até mesmo o regime do Simples Nacional – que resolveria a trava de faturamento do Inova Simples e, na maioria das vezes é escolhido por simplicidade contábil – pode se tornar mais complexo, não mais servindo de justificativa para deixar de realizar um detalhado planejamento tributário.

Nestes moldes, assim como não se recomenda a escolha do regime tributário por facilidade contábil, não há fundamento lógico para exigir que tal escolha seja procedida no ato do registro do CNPJ.

O planejamento tributário, para ser efetivo, precisa caminhar em conjunto com o planejamento estratégico da empresa e isso envolve uma análise detalhada, considerando não somente a redução de custo, mas todo o contexto empresarial.


https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202401/memp-divulga-aumento-de-5-1-de-empresas-abertas-nos-ultimos-quatro-meses-de-2023. Acesso em 29/07/2025

art. 23. As microempresas e as empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional não farão jus à apropriação nem transferirão créditos relativos a impostos ou contribuições abrangidos pelo Simples Nacional.

Art. 47. O contribuinte sujeito ao regime regular poderá apropriar créditos do IBS e da CBS quando ocorrer a extinção por qualquer das modalidades previstas no art. 27 dos débitos relativos às operações em que seja adquirente, excetuadas exclusivamente aquelas consideradas de uso ou consumo pessoal, nos termos do art. 57 desta Lei Complementar, e as demais hipóteses previstas nesta Lei Complementar.

Art. 21. É contribuinte do IBS e da CBS: I- o fornecedor que realizar operações: a) no desenvolvimento de atividade econômica; b) de modo habitual ou em volume que caracterize atividade econômica; ou c) de forma profissional, ainda que a profissão não seja regulamentada;

(...). § 1º O contribuinte de que trata o caput deste artigo é obrigado a se inscrever nos cadastros relativos ao IBS e à CBS.

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